domingo, 25 de janeiro de 2009

A velha rabugenta

Mora uma velha rabugenta dentro de mim. E ela está com o cachimbo sempre vazio.

Eu já tentei encher o cachimbo da velha de todo jeito. Já virei jornalista, desisti de ser assessora de imprensa e de fazer concurso público. Já fiz faxina no quarto às seis da manhã e quebrei o guarda-roupa. Quis ir embora pra sempre e desisti duas horas depois. Já gastei o dinheiro com uma lasanha à bolonhesa só porque achei que a velha estava cansada do meu regime e um prato de massa quentinha poderia colocá-la de bom humor. Não funcionou, e eu ainda fiquei sem um tostão pra encerrar o mês.

Já tive um monte de namorados e rolinhos de final de semana e filme abraçado, todos porque eu achava que tinham alguma coisa que poderia fazer a velha esquecer que está com o cachimbo vazio. Por algum tempo, a velha rabugenta que mora dentro de mim ajeita o xale, pede um escalda-pés e se acomoda. Mas é só por um tempo, que não demora muito ela sentir frio de novo e voltar a fazer noite de chuva dentro de mim. Noite de vodka, se eu não estivesse sem vontade de beber há um tempão.

Eu já gastei noites acordada tentando agradar a velha. E hoje, são cinco e meia da manhã de domingo e ela ainda não se aquietou, mesmo eu argumentando que tenho prova do concurso mais tarde e preciso dormir nem que seja um pouquinho só. Começa a chover e ela, toda rabugenta, mexe o cachimbo vazio entre os dentes e reclama do frio nos pés. Eu jogo mais um lençol por cima, mas nem assim ela se aquieta.

E aí que faz uns dias eu disse não, mesmo quando o corpo inteiro gritava um sim, de uma saudade gostosa escondida. Mas é que eu cismei que merecia mais então não ia me contentar com menos. Eu quero a felicidade de mocinha de novela que passa no Vale a Pena Ver de Novo, sabe?

Perguntei para a velha o que ela tinha achado da minha decisão de mulher correta e madura, mas ela só resmungou, puxou o xale esfarrapado um pouco mais pra cima e mordiscou a ponta do cachimbo ainda vazio, reclamando do frio que estava maior. Minha velha, e agora? Ela não soube responder.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Diálogos que levantam a auto-estima

Cena 01

- Nossa, quanto tempo! Desde aquela entrevista em janeiro do ano passado.

- Pois é. Mas menina, como você está gorda! Eu mal te reconheci.

- Gorda? Bom, er.. ahn... na verdade, engordei 10kg desde aquela época... mas você não precisava me lembrar disso não.

- Mas é porque você está gordona mesmo! Olha só o tamanho desses braços... estão até fofos! (ela fica apertando e soltando meus dois braços como quem amassa massa de trigo)

- Bom... pois é. Te vejo por aí, tá bom? Bom te rever, tchau!

***

Cena 02:

- Tão lindo aquele cara, não é verdade? Se bem que eu acho que dificilmente ele iria prestar atenção em mim.

- Ô, não diga isso. A menina que ele estava ficando na semana passada era até feinha...

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

No, no, no

- Minha filha, sabe aquela mulher do cabelão? Aquela, que pinta o olho pretão e sai andando na rua?

- Amy Winehouse, mãe.

- E aquela loirinha, que dizia que era toda virgenzinha mas não era? Como é mesmo o nome dela?

- Britney Spears, mãe.

- Pois é. Essas duas mesmo. Diz que criaram um jogo de videogame que elas têm que vencer um monte de obstáculos pra chegar numa mesa de entorpecentes.

***

Diálogo entre minha mãe e minha irmã, e eu passei dias tentando decidir o que é mais absurdo. Vida longa ao show bizz. Ou pensando melhor, no, no, no.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Doismiletombo

É estranho esse negócio de cair. Você tá assim, andando calmamente (ou apressadamente, na maior parte das vezes) e de repente os pés falseiam. Você balança por alguns pedaços de segundo, procura com os braços abertos algum ponto de apoio invisível. Mas na maior parte das vezes não funciona e, quando o segundo termina, lá está você, estatelado no chão.

2009 já começou assim, com tombo no batente da calçada igual menina de três anos de idade. Queda de criança, daquelas joelhos e palma da mão arranhados de sangue. Queda de passar vergonha no meio da rua, ainda bem que não tinha ninguém olhando, só o vigia que veio ajudar, menina, que queda feia.

Mas o mais chato de tudo nem foi o tombo.

Foi não ter ninguém pra contar.