sábado, 20 de fevereiro de 2010

Treze músicas

Eu cresci com a MPB para virar adolescente roqueirinha, depois fiquei presa nos anos 60 e 70 e me apaixonei tanto que não quis mais sair de lá. Daí que veio o convite dela (colega de profissão que eu nem sabia que passeava por aqui!) me convidar para o meu segundo meme. Novamente, um musical. Mas que desafio!

Eu já fiz uma seleção de músicas aqui. Mas dessa vez, as regras são diferentes. A idéia, ela me explicou, é “mostrar quem eu sou (ou quem estou) por meio de uma seleção de 13 músicas”. Como eu vou fazer isso? Eu, que escuto umas trezentas faixas por dia? Eu, que pensei em deletar o Office do meu computador para ter espaço para mais arquivos em .mp3? Como selecionar apenas 13, de milhares, sem ser injusta?

Mas o fato é que eu sei reconhecer um bom desafio quando vejo um.

Os critérios para escolha são diversos. Várias estão de fora com um nó na garganta. Escolhi algumas pela letra, outras porque tem o poder de me colocar para cima quando eu estou para baixo, outras porque me dá vontade de dançar assim que eu as escuto, outras porque me dá vontade de gritar. Todas porque estão na lista das que eu escuto todos os dias.

Ei-las.

1 – Pratododia (O Teatro Mágico)

Conheci O Teatro Mágico exatamente no dia em que fui aprovada na monografia, já que as nossas apresentações por aqui caíram no mesmo dia. Apesar da nota dez – minha e deles – eu vivia uma fase ruim. Tornou que eles me ajudaram – cantam tudo o que eu tenho vontade de dizer, só que mais bonito. Essa eu escuto umas dez vezes todos os dias. Eu deveria ter escrito, parece que ela fala por mim.

2 – Salão de Beleza (Zeca Baleiro)

Outra que está definitivamente na lista das que eu queria ter escrito. A sua beleza é bem maior do que qualquer beleza de qualquer salão. Eu sei, baby. Eu também acho, às vezes, que eu não preciso de salão de beleza.

3 – Freedom 90 (George Michael)

“All you have to do now is take these lies and make them true somehow”. O refrão é chicletinho, mas eu confesso que nunca prestei atenção direito nessa letra. Sabe como é, eu estava ocupada demais dançando.

4 – Trem das Onze (Demônios da Garoa)

Uma rede balançando. Um pai fazendo carinho nos cabelos da filha que tinha insônia desde pequenininha. Uma música cantada com voz meio desafinada. Uma moça que pode ter mil anos de idade e não vai conseguir escutar esse samba sem chorar.

5 – While my guitar gently weeps (The Beatles)

Há melhores e mais famosas, tenho certeza. Mas essa é uma das minhas preferidas do quarteto de Liverpool. Diz pouco, mas faz o essencial. Acalma e traz paz nos dias tão cheios que a gente se pergunta se jogou pedra na cruz ou se foi a própria cruz que resolveu cair em cima da gente com prego e tudo.

6 – É com esse que eu vou (Elis Regina)

Porque Elis é demais, porque lembra minha infância, porque me lembra que eu sonhava em cantar quando era mais nova, porque tem poucas vozes como a dela. Porque toda vez que eu escuto esse vozeirão me dá um quê de atrevimento, uma vontade de esquecer de passar creme no cabelo e ir desabafar na multidão. Só ainda não sei ainda com quem eu vou.

7 – Todo o Sentimento (Chico Buarque)

Outra que eu posso ter mil anos e ainda vai me dar nó na garganta. Disseram para mim uma vez que a música é sobre “O amor nos tempos do cólera”, do Garcia Marquez. Não sei se é. Sei que poucas promessas de amor são tão lindas e verdadeiras como essa.

8 – Gimme Shelter (Rolling Stones)

Porque Rolling Stones é vida. Porque é rock. Porque é arte. E porque todo mundo para conviver comigo tem que passar no teste dos Stones – isto é, me ver dançando e cantando num show, descabelada, rouca e com a maquiagem borrada, e não ficar com vergonha de dizer que me conhece.

9 – Billie Jean (Michael Jackson)

Faz dois anos que não damos uma festa sem essa música. Vale mencionar inclusive o episódio da noite de Ano Novo, quando o Michael não queria ser tocado de jeito nenhum e, quando forçamos a barra testando três CDs diferentes com a mesma música, faltou energia.

10 – Crush (Dave Matthews Band)

Porque eu gosto de... porque deve ser bom para... porque faz pensar em... deixa pra lá.

11 – Mustang Sally (Buddy Guy)

Clássico do blues de 1965. A versão original não é dele, mas é a minha preferida.Porque ele inspirou gente como Eric Clapton e Steve Ray Vaughan. E porque é a trilha sonora constante de todas as noites nos carnavais com jazz e blues. Esse ano, voltei rouca de tanto fazer o coro “riiide Sally riiide”...

12 – Running Wild (Johnny Reid)

Minha música de acordar preferida. Perfeita para aqueles dias que você acorda com o astral lá em cima e vontade de dominar o mundo. Pensando bem, ela também resolve a maior parte dos casos de mau humor.

13 – Tangerine (Led Zeppelin)

“I was her love, she was my queen, and now a thousand years between”. Doce no começo, azeda no final, gosto de tangerina. A música que batizou meu blog.

Finalmente, repasso o desafio para:

Seco Sarcástico Simpático

Tia Selma

Sonolóquios

Pingos nos is

Pequenos fragmentos de luz

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Desafiando o destino

Primeiro foi a escala do plantão de Carnaval que não saía. Jornais precisam circular todos os dias e é claro que assinantes e leitores não dão a mínima se o repórter quer viajar no feriado. A paciência nunca foi minha amiga. Tirei passagens de avião, pensando que se houvesse problema eu sempre poderia trocar. As passagens. Ou o emprego. Sei lá.

Depois veio a desproporção entre o número de amigos dispostos a acampar e o número de barracas disponíveis. Munida de todo o meu espírito aventureiro, até saí de casa disposta a comprar uma barraca. Provavelmente Carrie Bradshaw me alcançou no meio do caminho, porque voltei para casa sem barraca – mas com um par de sapatos novos que custaram praticamente a mesma coisa. E não me olhe assim. Os sapatos são lindos. Tão lindos que vão ficar por aqui – nem em sonho eu arriscaria usá-los num camping debaixo de chuva.

Claro que, depois dos $apato$, a condição seguinte só poderia dizer respeito à minha, er, falta de condição. As cifras se acumularam diante dos meu olhos e eu ficava mais desesperada quanto mais comparava a lista de despesas de viagem com o meu saldo bancário. As contas ainda vão estar aqui em março, lembrei. Já outra oportunidade igual, só em 2011.

Daí aconteceu que eu não tinha mochila e poucas coisas são tão incômodas quando se quer bancar a mochileira que a falta deste apetrecho básico. Meu cunhado me emprestou uma mochila escolar simples. Não coube metade do que queria levar. Abri mão de um jeans e duas camisetas e sentei na mochila para conseguir fechar o zíper. Melhor, assim eu não compro nada por lá, já que não tem onde trazer.

Três dias antes da viagem recebo a notícia de que a barraca que conseguiram para mim não serve. Um tarde inteira de telefonemas desesperados até aparecer uma barraca extra, cujo estado já me preveniram que pode não ser dos mais aconchegantes. Contanto que não inunde igual à do ano passado.

Procu
rando informações sobre a viagem na internet, descubro um boato de que não há mais passagens de ônibus para completar o trajeto. Descubro tsmbém que estou sem poder fazer ligações interurbana e fico sem ter como checar com a empresa que faz as viagens.

Passo a antevéspera e a véspera da viagem febril, gripada, nariz entupido e tossindo nojento e quebrando de catarro. Não ficava tão gripada assim desde... espera, eu já fiquei gripada desse jeito?

Quase sempre que algo não me é essencial e fica complicado demais eu desisto. Um convite para sair que chega cheio de empecilhos, uma balada sem companhia, um relacionamento que iria requerer investimento e uma boa dose de luta para dar certo. Eu sempre achei que os pequenos empecilhos eram cones que o destino colocava no meio da estrada para nos avisar que não devíamos ir por ali.

Só que esses dias eu fiquei com vontade de ziguezaguear por entre os cones.


E é por isso que, daqui a cinco horas e meia, eu vou.


Esperem aí que eu estou chegando!!!


Destino, nos revemos na quarta-feira de cinzas.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Para Cecília

A Cecília me pergunta em que espelho ficou perdida a face dela. Não faço idéia, mas eu bem que deveria devolver a pergunta: Cecília, e quanto à minha face, cadê?

Olho de novo para o espelho, qual madrasta malvada sem Branca de Neve. Existe alguém mais bela do que eu? E mais triste? Existe um quarto mais bagunçado que o meu? O espelho, espelho meu bem poderia ser o retrovisor. O carro estacionado no meio da via expressa e eu o dia inteiro olhando para frente mas na verdade olhando para trás, para longe, longe, tentando decifrar qual é aquele ponto de fuga. Acho que foi ali que mudou tudo, só falta descobrir onde foi. Deve estar ali o tal do espelho que roubou a face da Cecília. Vai ver é até o mesmo buraco do espelho do Arnaldo Antunes. Aquele, que me deixou trancada aqui dentro do lado de fora, do lado de cá onde eu caí. E não sei como faz para voltar.

Até uns meses atrás eu era muralha de pedra. Hoje de repente ficou assim, joelho ralado de menino, que dói até com a brisa mais leve que bate. O espelho reflete olhinhos de insônia. Cadê sorriso que brilha, cadê salto alto, cadê trocadilho sem graça? Cecília, eu também não tinha os olhos vazios e o lábio amargo. A diferença é que eu não tenho nem vinte e cinco anos.

E, embora também não esteja nem alegre, nem triste, continuo em desvantagem: não sou poeta.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Gente-casa

(Luis Fernando Veríssimo)

"Existe gente-casa e gente-apartamento. Não tem nada a ver com o tamanho: há pessoas pequenas que você sabe, só de olhar, que dentro têm dois pisos e escadaria e pessoas grandes com um interior apertado, sala e quitinete. Também não tem nada a ver com caráter. Gente-casa não é necessariamente melhor que gente-apartamento. A casa que alguns têm por dentro pode estar abandonada, a pessoa pode ser apenas uma fachada para uma armadilha ou um bordel. Já uma pessoa-apartamento pode ter um interior simples, mas bem ajeitado e agradável. É muito melhor conviver com um dois quartos, sala, cozinha e dependências do que com um labirinto.

Algumas pessoas não são apenas casas. São mansões. Com sótão e porão e tudo que eles comportam, inclusive baús antigos, fantasmas e alguns ratos. É fascinante quando alguém que você não imaginava ser mais do que um apartamento com, vá lá, uma suíte, de repente se revela um sobrado com pátio interno, adega e solário. É sempre arriscado prejulgar: você pode começar um relacionamento com alguém pensando que é um quarto-e-sala conjugado e se descobrir perdido em corredores escuros, e quando abre uma porta, dá no quarto de uma tia louca. Pensando bem, todo mundo tem uma casa por dentro, ou no mínimo, bem lá no fundo, um porão. Ninguém é simples. Tudo, afinal, é só a ponta de um iceberg (salvo ponta de iceberg, que pode ser outra coisa) e muitas vezes quem aparenta ser apenas uma cobertura funcional com quarto, sala, lavabo e cozinha só está escondendo suas masmorras".