sexta-feira, 29 de maio de 2009

Enumerações de Lagartixa

Eu sempre fui um misto de menina medrosa com um resto de “oh-mas-que-será-que-vão-pensar-de-mim”? Daí que nessa eu fico num jeito de querer se soltar com dever se retrair e o resultado é esse – curtida e comprida, torta, torcida e, não raro, distorcida. Ora enchendo até derramar, ora deixando morrer por secar. Eu não sei a medida certa das coisas.

Eu tinha um amigo que toda vez que eu dizia que ia fazer qualquer coisa ele retrucava: “Duvido, você é classe média e vai ficar ai mesmo”. Meu pai nem se incomoda mais. Diz “decide aí e me avisa” e para de retornar meus telefonemas e emails, até eu aparecer com um novo plano mirabolante para mudar a vida de uma vez por todas e ser linda, magra, rica e enfrentar um dia inteiro trabalhando no sol quente sem manchar a blusa branca.

Mas nada nunca muda e realizações grandes e pequenas vão virando pacotinhos de presente não abertos espalhados nos cantinhos da sala. O telefonema que a gente deveria tomar coragem e fazer. A tentativa de beijo que morreu sufocada num “boa noite” tímido. O currículo que ficou esquecido na gaveta. Todas as viagens não-feitas, todos os livros não-lidos, os dias que você deixou para viver amanhã, amanhã, amanhã... Confessa: você também tem desses.

O desejo de faltar no trabalho, de pedir um aumento e de pedir demissão se o aumento não vier. De gritar para fora do carro quando passa pelo túnel do viaduto ou em cima da ponte olhando pro mar. De se jogar no mar de roupa e tudo, de jogar na parede e chamar de lagartixa e depois se esticar muito igual lagartixa ao sol, sorriso no rosto e olhinhos fechados de puro contentamento.

Eu quero isso tudo. Mas a maior parte dos dias eu vou trabalhar de roupa velha, me faço em tons pastel e solto uma gargalhada escandalosa pra fazer de conta que sou colorida. E volto pra casa lenta e me encolhendo que nem lagartixa no frio, meio espremida entre um e outro no ônibus lotado.

Daí que eu quero fazer um trato de fazer tudo que der na veneta. Mas pra você, não pra mim. Sair e encher a cara, fazer a viagem dos sonhos, tirar umas férias e aproveitar a vida, se permitir engordar, e mais: se permitir não querer emagrecer porque dá muito trabalho. Falar montes de besteiras e dizer verdades sem pensar e contar piadas politicamente incorretas. Anda, começou agora, levanta, passa um gel no cabelo, põe um sapato novo e sai pra vida!

Vai, pra bem longe, anda, o que é que você ainda está fazendo aqui lendo?

Quanto a mim... vai indo que eu vou já. Sabe como é, ainda estou morrendo de medo e considerando a hipótese.

terça-feira, 26 de maio de 2009

Eu não amo ninguém.

- Tô sem idéias pra atualizar o blog.

- Escreve isso aqui, ó.

Ele me manda a letra de “Preciso dizer que te amo”, do Cazuza. Eu escuto música como leio poesia: toda egocêntrica que sou, avalio as palavras na medida que elas conseguem pôr em versos ou linhas de partitura o que eu só sei dizer em prosa de jornalista. Li e ouvi, remexi o coração até bem lá no fundinho do baticum e não tinha ninguém lá. Pra quem eu “preciso dizer que te amo”? Cazuza falhou comigo hoje. Eu não amo ninguém.

O quê? Como assim? Já dá para ver os defensores da vida cor-de-rosa se agitando em passeata. É que dito assim fica radical, como se eu fosse mesmo megera e amarga sem pai nem mãe nem um amigo nessa vida. É claro que eu tenho, e provavelmente os amo. Eu falo do baticum descompassado no ritmo das borboletas que sem mais nem menos fazem casa no estômago das pessoas e ficam batendo asinhas quando o outro passa por perto. Tem vida que tem isso todo dia, não é? A minha não. pelo menos não agora. Ao contrário do Cazuza, depois de ano e meio de solteirice eu não tenho isso de não saber que hora dizer e dar um medo. Que medo?

Vai ver eu ainda vou achar alguém no meio do baticum. Só que aí não vai ser um amorzinho acanhado, encolhido lá no fundo de medo de ser percebido. Vai ser um grande demais e impossível de esconder, fogoso e escandaloso gritando em letreiro de neón multicolorido e arrebentando com artéria e tudo se eu não der jeito logo nas borboletas. Vai ser calor e calafrio, coração saindo pela boca ao mesmo tempo que a alma escorre na garganta. Quem disse que amor é calminho e pleno? Pode até ter sabor de fruta mordida todo amor que houver nessa vida, mas não é amor tranquilo. Acredito nisso não. Pode ter duzentos anos de idade, mas onde junta cromossomo X com Y, as borboletas estão lá.

Mas nesses últimos dias eu sou só pergaminho raspado esperando tinta pra fazer história nova. Só por enquanto, ah, por enquanto faz falta qualquer coisa que se sinta e ganhar ou perder. Com ou sem engano?

quinta-feira, 21 de maio de 2009

Meu primeiro Meme. Oba!

Iupiiii! Eu sempre quis responder a um desses memes que vejo pelos blogs alheios, mas ninguém nunca tinha se incomodado de me passar um. Até hoje, quando a Lígia, do Passando uma chuva, me mandou esse aqui direto lá da terra de cerveja Guiness.

Memear, explicou ela, quer dizer imitar algo. Eis as regras: escolher um cantor(a) ou grupo; para cada pergunta feita, escolher um título ou trecho de uma música como resposta, por último, repassar a outros blogs.

Eu pensei e escarafunchei e fumacei tanto que queria fazer uns dez memes diferentes, um pra cada um desses músicos meio autobiográficos. Mas me controlei e escolhi só um: o Paulinho Moska. Meu caso com ele é antigo, mas a paixão mesmo veio em 2005, quando ganhei ingressos pra um show de presente de aniversário. Ri, cantei junto, tietei até altas horas da madrugada e tirei uma foto com ele que saiu horrível. Eu fiquei por aqui, amando. O Moska ficou por lá, compondo pra ele, mas falando por mim.

Segue o meme:

És homem ou mulher?
“Eu não sei se o céu tava azul ou preto/ eu não sei de nada, eu não vi direito/ O bem me quer, o mal também me quer, eu tô como o diabo gosta e seja o que Deus quiser”

(Seja o que Deus quiser)

Descreve-te:
“Sou um móbile solto no furacão, qualquer calmaria me dá... solidão”
(Um móbile no furacão)

O que as pessoas acham de ti:
“Ele nasceu para ser o melhor/ seus pais projetaram o futuro ideal/ Nada lhes daria mais prazer do que vê-lo crescer bem”
(Castelos de Areia)

Como descreves teu último relacionamento:
"Eu daqui você de lá/ encontros virtuais todo dia/ Já nem sei no que vai dar/ nossa paisagem nova, pop filosofia"
Virtual (mente)

Descreve o momento atual de tua relação:
“Essa é a última solidão da sua vida/ Aproveite e cure a última ferida/ E nunca mais solidão”
(Essa é a última solidão da sua vida)

Onde querias estar agora:
“Até amanhã, e ponto final / Pra ir pro paraíso, tudo que eu preciso é de outra realidade pra anestesiar/ Nossa viagem sem sair do lugar”
(Virtual (mente))

O que pensas a respeito do amor?
"Amor em jejum, Amor transbordado de Amor comum/ serão por mim dispensados/ Eu quero amor em calda, Amor em pasta / O Amor que eu tenho já não me basta”
(Qualquer outro amor)

Como é tua vida?
“Pra onde essa onda vai? De onde essa onda vem? Eu não sei o que ela me traz mas o meu desejo é que me leve também”
(Onde anda a onda)

O que pedirias se pudesses ter só um desejo?
“Vamos acordar os mortos/ Vamos acordar/ Vamos acordar os mortos e vê-los ressuscitar”

(Vamos acordar os mortos)

Escreve uma frase sábia:
“Então me diz qual é a graça de já saber o fim da estrada quando se parte rumo ao nada?”
A seta e o alvo

Agora a parte difícil: quem também gosta de responder essas coisas? Não sei, mas repasso pro Mephisto, do Torna-te quem tu és!, pro Marco do Marcotomia, pra Michelle, do Vendo o Mundo, para o Coeli, que eu acho que vai achar frescura e não vai responder, e pra Hanna, do Fala, Cabrita!, só para ela ter uma desculpa para reativar o blogue.

Atualizado: Em 27/05 para indicar também para a Tia Selma, que gostou da idéia e quis brincar também.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Fazendo as pazes com Martha Medeiros


Cheia de coisas para fazer mas sem muito que eu quisesse começar de fato, acabei de fazer um desses testes de Internet. Se eu fosse um livro nacional, qual eu seria? Um best-seller ultra popular um relato intimista? Coincidência ou não, não é que o resultado foi justamente o livro que estou (tri)(re)lendo no momento? Doidas e Santas, da Martha Medeiros.

Fiz as pazes com ela depois dessas crônicas. Pra ser sincera, eu não era lá muito fã da moça. Os únicos textos que me chegavam dela eram via correntes de email. Aqueles textos de autoria duvidosa e que sempre me pareciam mais relatos de autoajuda e receitas prontas de como ter uma vida feliz. Daí que um dia desses eu estava conversando com um amigo e, livros copos e pontas de cigarro alheias espalhados na mesa da sala, ele me vem mostrar algumas historinhas da moça.

Torci o nariz mentalmente mas, em nome da amizade e dos tantos copos de vodka já ingeridos, não reclamei – e ainda bem que não. Em vez de alguém me explicando como “ a pessoa errada poderia ser a pessoa mais importante da minha vida”, de algum Luis Fernando genérico que nada tem a ver com o Veríssimo, achei uma moça que tece pequenas grandes crônicas de cotidiano a partir de tudo que é história, banal ou não. Curiosa, meio doida e nada santa, levei as Doidas e Santas da Martha emprestadas para casa.

Em geral, eu gosto de quase tudo que é crônica e sempre as leio de pouquinho, rendendo feito o último quadradinho da barra de chocolate. Com a Martha não foi diferente. Do ladinho da minha cama já há algumas semanas, a moça me brindou todo dia com historinhas diferentes. De comer pipoca em frente à TV ela me mostrou que eu tenho que parar de ser medrosa e me jogar nas coisas pra não ser piruá. Mostrou que quase todo mundo tem barriga e que eu posso gostar da minha (essa inominável!). E até que eu, sempre tão ferrenha defensora da Língua Portuguesa, posso achar interessante o descarte da norma culta como uma espécie de louvor à imperfeição cotidiana.

Se a Martha tem receitas de viver, todas elas devem ser de pudim de chocolate, até quando ela fala de coisa triste. Livro terminado já umas três vezes, só falta a vontade de devolver. Posso só mais uns diazinhos? Posso? Posso?

*Quem ainda não conhece a moça pode começar por aqui e também por aqui, ou por onde quiser.

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Quando auto-ajuda ajuda!

- Eu vou te contar uma história.

- Conta.

“ Há uma linhagem no budismo em que os monges não podem tocar nas mulheres, pra não despertar o desejo e assim se manterem castos. Vinha o mestre e seu discípulo andando e chegaram na beira do rio, e uma mulher precisava de ajuda para atravessar. Prontamente o mestre carregou a mulher nos ombros e a deixou do outro lado do rio.

O monge e o discípulo continuaram a caminhar. No fim do dia o discípulo pergunta: ‘O senhor disse que a gente não poderia tocar em mulheres, mas o senhor colocou aquela no ombro e atravessou o rio’.

E o mestre retrucou: ‘ você ainda está carregando aquela mulher? Eu a deixei do outro lado do rio’.”

- Tá. E isso quer dizer o que exatamente?

- Que você só leva as coisas até onde quer. Elas têm um fim, e você não precisa carregar tudo com você, a vida toda.

- É...

- Então, faz assim: deixa a mulher do outro lado do rio, e segue com a tua vida. Combinado?


No meio dos meus choramingos de “não-quero-falar-sobre-isso”, ele me veio com uma historinha zen. E, contrariando o que sempre pensei, foi o que me pôs inteira de novo depois de um domingo que não deveria ter existido.

E quanto à mulher, vai ficar lá, do outro lado do rio. Já passei tempo demais com ela e bem que está na hora de caminhar sozinha. E vocês? Vão deixar o quê lá na outra margem?




sábado, 9 de maio de 2009

Curto-circuito

Eu disse “acerta as pontas”, ele entendeu “iguala com a franja” e cá estou eu, com pescoço a descoberto e as madeixas mais longas terminando na ponta das orelhas. Sorriso amarelo para o cabeleireiro e meia hora de estranhamento em frente ao espelho depois, até que não ficou tão ruim. No calor escaldante de hoje de manhã, percebi o quanto o vento é uma delícia toda vez que bate na nuca e faz cosquinha atrás das orelhas.

Só que agora fiquei eu aqui com tudo curtinho. Curto feito o salário que ainda nem é dia dez e os últimos trocadinhos já estão agarrados no fundo da carteira, pedindo para durar ao menos mais uma semana. Saúde curta depois de dois dias de febre enxaqueca e calafrio e trabalhando mesmo assim. Paciência curta também. Ou nem é, é só pra fazer tipo, encaixar no texto e combinar com a conseqüência mais lógica das minhas noites de sono – adivinhe só - cada vez mais curtas.

Sem dormir direito e acordando tarde, os dias também ficam cada vez mais curtos. Daí que adeus à academia, à idéia da dança do ventre e à dança de salão e aos duzentos e trinta e oito médicos que deveria ter consultado nos últimos meses. Meses que, de tão curtinhos, dão a impressão que metade do ano já passou e você ainda nem viu, nem fez nada de útil - tipo uma grande mudança na vida, uma redecoração no quarto, nem teve um curto, porém grande amor e por aí vai. Mas por enquanto nem faz falta. Só sobra, na verdade, alguma vontade de repetir uma manhã curtinha, dormindo abraçada no espaço curto debaixo do edredon alheio.

Enquanto nada disso me vem, chega de curtos, pelo menos os que não me satisfazem ou os que posso evitar. O cabelo, eu engano com um lenço esquisito ou prendo com uma fivela diferente e pago de moderninha. Mas chega pensar curto e de sentir curto, assim pequenininho como se o coração também fosse curtinho. Com o perdão do infame trocadilho, já está mais do que na hora. Chega de curtir tudo igual, eu quero um curto-circuito.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Lavanda Dona Benta

E diz que numa madrugada dessas, insone em frente à tevê, me vem o comercial de uma certa linha de perfumes apresentada por uma dessas revelações mirins dos programas de auditório. Na propaganda, a guria conversa com uma modelo e as duas discutem o que vão dar para suas mães. O diálogo é mais ou menos assim:

- O que te faz lembrar sua mãe?

- Cheirinho de roupa limpa.

- A minha eu lembro com cheiro de flor.

- E de bolo? A minha mãe faz um bolo...

- Tem sempre um cheiro que lembra quem a gente ama.

- Retribua esse amor!

Ainda estou confusa. Será que eles esperam que eu dê um vidro de amaciante de roupa para a minha mãe? Ou que faça um bolo? Ou, bem – e talvez seja essa a verdadeira inovação – vai ver eles vendem perfumes com essências pouco ortodoxas, inspiradas em bolo e roupa lavada. Eau de Mon Bijou, Lavanda Dona Benta. Você gostaria de sair cheirando a fermento por aí? Eu não.