(Diz que hoje eu resolvi passear pelo orkut. Fiz isso por uma boa meia-hora até enjoar de tanto ler "namorando" e ver bonequinhos cabeçudos com olhos de coração distribuindo rosas de mãos dadas estapeando bundas alheias ou comendo cérebros uns dos outros e fazer disso a coisa mais romântica do mundo. Quando eu era adolescente, a gente dividia um picolé de Morango Frutilly...
De repente pa

rece que o ar ficou meio cor-de-rosa e tá todo mundo namorando, menos eu. Todo mundo suspirando e eu olhando pros meus lençóis desfeitos. E nem é que não haja ninguém que eu queira namorar - meu coração tem dado lá suas aceleradas numa direção nova esses dias. Infelizmente, o inverso nunca ocorre e ele vai dormir pensando que eu sou uma mulher Bonita & Inteligente & Liberal pra quem ele nunca vai precisar ligar no dia seguinte. Mais confortável que se eu fosse um sofá de três lugares.
Daí que pensando nisso tudo e me sentindo mais sozinha que Robinson Crusoé numa quinta-feira, resolvi que já estou cansada, até porque hoje completa dez meses do
status single, e vinte e três anos sem um relacionamento em que eu não terminasse traída, sacaneada, gorda, arreliada, sem tesão, com a auto-estima baixa etc etc etc. Eu bem que precisava de um alguém que nem precisava ser pra sempre - mas que eu olhasse daqui a alguns anos e suspirasse "ah como Fulaninho era bom".
Daí que, na falta de alguém real e, principalmente, normal e não-traumatizado, resolvi que
vou inventar o meu namorado.E sim, eu tenho esse direito. Crianças pequenas não são censuradas por amigos imaginários, da mesma maneira que um grau moderado de esquizofrenia virual deve ser tolerado em jovens mulheres adultas e solteiras.
***
O primeiro passo é imaginar a aparência. Ele não tem aquela beleza de colírio da Capricho. Na verdade, ele é um pouquinho desengonçado, de um jeito meio atrapalhado que me faz rir e não ficar com vergonha de ser meio destrambelhada também. Ah, e ele vai ser moreno. Uma barriguinha é até desejável.
Ele vai ter o cabelo naquele estágio que a gente pensa "bem que já estava na hora de ele cortar", mas que ainda não ficou grande a ponto de incomodar. Mas a barba, ah, a barba ele vai lembrar de fazer de vez em quando só pra raspar no meu rosto depois. Sobretudo, ele vai ter um jeito de me olhar sério e me derreter inteira, e um sorriso que lembre levemente aqueles estampados em caixa de creme dental. Ah, e ele é alto - qualquer coisa maior que 1,85m - e tem

mãos de massagista de spa.
Ele vai estudar alguma coisa que eu não entenda bem, mas ache fascinante - talvez na área de economia ou alguma área social - e com certeza vai pensar que ser jornalista é a profissão mais sexy do mundo. Provavelmente ele tocar algum instrumento também. Vai me achar inteligente até quando eu fizer algum comentário de orelha de livro querendo impressionar, e vai me surpreender de vez em quando me explicando as coisas que eu não conseguir entender.

Ele terá bom humor e vai fazer tanta piada que às vezes vai me irritar e eu vou começar a achá-lo meio criança. Vai ter manias esquisitas que vão me arreliar ou me dar vontade de rir, dependendo do meu humor, e vai ser um saco quando estiver doente. Vai gostar das mesmas bandas que eu e me apresentar uns troços de que eu nunca ouvi falar, e vai se divertir comigo na mesma proporção em um show cheio de gente se apertando na fila do gargarejo ou num arrastapé.
Ele não vai ser nem tão inteligente a ponto de eu me sentir burra, nem tão tapado a ponto de comerter erros crassos de Português e me deixar sem conseguir manter uma discussão num nível decente.Vai fazer piadas e divertir as minhas amigas e depois me abraçar na frente delas. Vai aparecer pra me ver com um bombom de chocolate (só um!) quando eu não estiver esperando.
E, sobretudo, ele vai olhar pra mim e não vai querer me largar mais.
Pronto. Tô namorando. Viu como é fácil?