segunda-feira, 22 de setembro de 2008

A dor de saber exatamente o que se quer

Quando eu era pequenininha que ainda andava pela casa de sandália Ortopé, eu dizia que queria ser pediatra, porque adorava criança. Depois entrei numa de ser cantora, deve ter sido na época que Daniela Mercury (!) apareceu na tevê gritando que o canto da cidade era ela e coisa e tal. Quis ser atriz também, bem antes de prever que dois anos de oficina de teatro na adolescência trariam à tona o meu sofrível, porém reduzido, talento dramático.

Tudo isso antes dos dez anos. Porque foi mais ou menos por aí que eu surgi com uma idéia nova, deixando papai e mamãe de cabelo em pé. Vai ver que era a primeira vez que eles sentiram que a coisa era realmente séria.

Eu queria ser escritora.

Desde que me lembro eu sempre escrevi. Nunca brilhantemente, mas sempre em muitas páginas. Arremedos de crônicas, pouquíssimos contos, cartas e pequenos grandes desabafos a maior parte do tempo. E é desde sempre também a paixão pelas palavras, que na maior parte dos dias me vêm tão fácil e deliciosamente como se tivessem suas próprias formas e texturas, saindo da boca ou da ponta dos dedos ora moles e delicadas como pedaço de miolo de pão, ora como a força do baque duro de um halteres despencando no chão.

Daí que eu decidi que o jeito mais fácil de ganhar a vida escrevendo era sendo jornalista. Aos onze anos, eu já havia escolhido minha futura profissão, mas jamais imaginaria o amor que um dia iria sentir pela imprevisilidade diária das notícias, o orgulho de uma manchete de domingo, a satisfação do poder de mudar um destino na ponta dos dedos. Em nome desse amor passional eu enfrentei família, a possibilidade de queda violenta no meu padrão de vida e até voltei 840km de orgulho engolido a seco, lá da Barroland direto para a casa da mãe.

E o que eu acho que deveria ser a regra, se revelou a exceção. Nunca passou pela minha cabeça a possibilidade de encher meus dias com algo de que eu realmente não gostasse. E de repente, na mesa de lanchonete e um monte de gente reunida, eu só tinha olho comprido pro cachorro quente cheio de maionese que o regime não me deixou comer, enquanto gente tão próxima me contava que o que havia escolhido para fazer pelo resto da vida talvez fosse totalmente diferente daquilo que realmente queria fazer pelo resto da vida.

Cineastas que vão dar boas advogadas, potenciais juízes apaixonados mesmo é por economia e gente que eu sei que sonha mesmo é com História e gente que tá em outro ramo mas que eu sei que encomprida o olho pra Psicologia. Eu parei de pensar no cachorro quente e me perguntei se eu ou eles eram os felizardos. Vai ver eu nunca experimentei mais nada, nunca quis outra coisa, nunca admiti a possibilidade de ser diferente. Enquanto todo mundo que conheço ainda está experimentando, ou conquistando segurança, eu paguei o preço de um sonho.

E agora, faço o quê com ele?

“Lembre que você nem pode mais reclamar”, ele diz. O meu amigo puxa a minha mão lá do canto da mesa e sorri, maroto. “Foi você quem escolheu”. E vai ver, no final das contas, ele tem toda a razão. Entrei em casa pensando que é uma questão de prioridades. E embora eu seja uma medrosa de marca maior, a minha nunca foi a segurança.

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Melhor de três

Sibutramina, chá verde, regime.
Maracujina, valeriana, dormir
Leite morno, blogs, insônia.
Tendinite, preguicite, celulite.
Neosaldina, Café quente, acordar.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Parem de falar mal da rotina!

O tal do espetáculo da Elisa Lucinda. Eu sou fã da mulher, excelente atriz, poeta melhor ainda, mesmo ela atuando de vez em quando em novela das oito como melhor amiga da moça boazinha.

Mas o gancho nem era esse. É que diz que faz pouco eu andava conversando pelas bandas do EmeEsseEne com um amigo. Dele, eu tenho a recordação de noites de risadas sem fim e cócegas no pescoço. Coisa de amigo baixinho que não consegue alcançar meus saltos pra me dar um beijo decente na bochecha.

Quando é que vamos nos ver de novo?

Ah, mas vocês só saem pra conversar...

Não é a primeira vez que isso parece estranho. De outra vez amanheci o dia na rua, perdemos a hora conversando de novo, um pedaço de trapo pegou o ônibus pra trabalhar o dia seguinte no meu lugar.

Como assim, você me diz que passou a noite na rua e não bebeu?

Bebi, ué, e foram duas garrafas de água mineral. Deu sede depois de falar tanto.

E olha que eu não sou de desprezar caipirinha e cerveja geladinha. Mas vai ver eu sou a última pessoa do mundo que vê graça e até um pouco de magia nas conversas olhando a lua até o dia quase clarear. Vai ver eu estou ficando velha, vai ver não se fazem mais shows como antigamente, vai ver os bares andam cheios demais e eu não tenho paciência pra lista de espera, vai ver a minha cidade é pequena demais, vai ver eu estou mesmo desperdiçando os melhores anos da minha vida e coisa e tal.

Ou vai ver eu só ame a rotina. Ame a segurança de acordar todo dia no mesmo horário, escolher uma roupa mais ou menos do mesmo jeito, ir trabalhar e deixar a imprevisibilidade para o dia a dia das redações. É fato que eu não acordo com a boca de hortelã (!) nem tenho ninguém pra sacudir e, bom, já ficou claro, sem trocadilho, que seis da manhã no meu mundo é hora de ir dormir. Mesmo assim, Chico não poderia estar errado, é bom todo dia fazer tudo sempre igual.

É que eu sou o tipo de menina resistente a mudanças, tão resistente que não gosta nem quando os amigos trocam o número do celular e que sugere ir sempre à mesma lanchonete pra pedir o mesmo sanduíche, nem consigo lembrar a última vez que incluí algo novo na minha alimentação. Eu me divirto jogando baralho.

É fato que eu tenho saudade das borboletas no estômago que antecedem qualquer mudança brusca no dia-a-dia tão igual, sempre tão colorido, mas sempre exatamente com as mesmas cores.

Um dia eu vou voltar a sentir as borboletas de novo, e vai ser para o bem.

Só para eu começar uma nova rotina.

( o poema na íntegra é pra estar aqui)

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Pequenas hipérboles númericas*

Trezentas e cinqüenta e oito mil pequenas tarefas de trabalho que eu deveria adiantar para a semana que vem.

Um milhão, novecentos e setenta e cinco mil, quatrocentos e vinte e três mil livros acumulados em cima da mesa do computador e no criado mudo ao lado da cama, esperando para serem lidos.

Duzentos e trinta e seis emails não respondidos.

Oitocentos e sessenta e dois metros quadrados de quarto esperando para serem limpos, um quarto disso de banheiro.

Novecentos milhões de quilos a serem perdidos.

Quinhentos e oitenta e quatro centímetros de cintura a serem perdidos, a metade disso no quadril.

Cento e oitenta e quatro anotações de viagem que renderiam assuntos interessantes para o blog, portanto, cento e oitenta e quatro textos com potencial inescritos.

Zero telefonema até o momento.

Alguém me tira daqui?


*Paradoxo proposital.