quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Do Curriculum Vitae como reforço de autoestima – Parte I


Enviar mais de trinta currículos num mês, preencher páginas e páginas de seleção para programas de trainee no meio de um mês de férias – mais: férias no Rio de Janeiro – dá o que pensar. É combustível para um revisão completa da vida, com direito a indagar quem você é, de onde veio e para onde vai – aliás, será que não respondi isso num desses processos seletivos online uma hora atrás?


Além de idade, escolaridade e nome de papai e mamãe, já dei a minha opinião sobre a crise no Senado e analisei a imprensa maranhense face à atual rotina de escândalos envolvendo José Sarney. Já escrevi um texto sobre o Michael Jackson e outro relatando três situações-problema na minha vida profissional que consegui resolver com sucesso. Já expliquei minhas perspectivas de carreira face às limitações instituídas com a crise mundial.


Já contei porque amo o meu trabalho mais que tudo mas mesmo assim quero trabalhar com vendas/ com geração de energia/ com investidores/ com decoradores/ numa grande redação. Já contei a minha maior qualidade, o meu maior defeito e o número de horas que passo ouvindo música, a quantidade de baladas que sou capaz de freqüentar num mês e até o número de horas que gasto dormindo – certamente, não muitas. Mas afinal, fazer currículo é a arte de mostrar o melhor de mim e ninguém precisa saber, até o primeiro dia em que eu aparecer com olheiras fundas às sete da manhã, que eu sofro de insônia crônica desde a barriga de mamãe.


O problema é que nem só de abstrações filosóficas e descrições da minha rotina se faz a procura por um emprego melhor. Bem mais diverso é o campo de exigências das empresas que requerem um profissional abrangente em todos os campos do conhecimento humano – exceto, claro, o Jornalismo. Nos últimos vinte dias, já me foram solicitados conhecimentos do céu, do mar e da terra: sobre decoração, gastronomia, mercado imobiliário, engenharia de tráfego e até com o ramo portuário e tecnologia espacial. Quer tentar? Vai lá, eu não passei não.


Com o perdão do lugar comum, mas em um mês de leitura diária de anúncios de vagas Internet afora, a gente faz uma revisão de vida, começando aos dezessete anos, no dia em que vesti o primeiro terninho, anexei uma carta de recomendação ao currículo cuidadosamente elaborado junto com o papai e fui bater de porta em porta em porta: “Moço, o senhor tem um estágio? É que eu quero ser jornalista. Nem precisa ser logo pagando, não”. E terminando na última reunião de editores em que eu teimei “A manchete do jornal é essa e pronto” e foi essa e pronto, que legal, volta pra casa e vai pensando na suíte.


Mas por agora, eu queria férias infinitas só para mandar currículo todo dia, que eu já estou ficando expert em preencher formulários. Ou, bem, só até no dia em que o telefone finalmente vai tocar e vai ser a dona Fulana de Tal da empresa X, “Olá, você pode comparecer a uma entrevista amanhã às 15h?”. Sim, porque nos meus sonhos nada acontece de manhã. Nesse horário, eu sempre tenho olheiras.

Um comentário:

tiaselma.com disse...

Mas essa tangerina anda boa demais!
Agora, currículo para dar certo (no bom sentido, claro), sem mentiras à la Dilma e petralhas, está complicado...
Let's keep trying.

Beijocas.